quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

FRAGMENTOS DE VIDA ESPARSA

Esse foi(ou é...) um livro que eu iria publicar em 2001. Uma coletânea de poemas feitos entre 96 e 2001. Por razões de um (talvez)excesso de auto-crítica não o lancei...mas depois de ver e ler tantos "poetas" piores, me tornei um pouco mais auto-indulgente e decidi compartilhá-lo antes que eu morra e ninguém descubra que eu era alfabetizado também...


FRAGMENTOS DE VIDA ESPARSA
SEM TÍTULO
Eu contenho tudo que me rodeia
a vaidade é certa e real - não ser o que
não é, e sim ser melhor sendo o que sou
meu disfarce/mundo me permite habitar
despercebido a flor do jardim em abandono
eu tenho tudo que preciso em mim
colho a esperança que me falta
do fracasso e expiro a vida para respirá-la
mais fundo depois
me permito metabolizar os erros antigos
não mais errar. Excluo da minha decisão apenas
os novos erros.
POIÉSIS TEDEUM
Odeio poesia - Morte ao poema
...E meu poema também foi estrangulado
Destituído de seu último verso
Pretenso bonito, meu amor morreu e celebro sua morte
Em meu poema...Eu sou o objeto do meu desejo
Esquecido em alguma curva do fracasso
Na estrada de chão da infância, que me reencontro
Agora na esquina - Invento a nova linguagem
Minha para mim mesmo:
Sem mais revoluções postiças!
Sem mais arautos para o que do olhar da alma
Já é tão sabido!
SEM TÍTULO
A docilidade da fêmea ao ser coberta
Era aquela que mostravas
Ao abrir as pernas
- nós dois - algo tão natural...
11 DE AGOSTO
Como que liberto
na procura ávida de quem não sabe
ao certo o que procura
mas essa falta
desesperada de algo que foi
- talvez sem nunca ter estado - sente
saio porta afora
amigo da lua
a pantomima das sombras sob os postes
sussurro ao vento:
"hoje quero vê-la como antes"
comigo um pedaço do asfalto preso ao tênis levo
na iminência do gesto dezenas de versos
- dentro de mim monólogos inexprimíveis -
levo uma flor de celofane
colhida do meio fio
"hoje quero vê-la ainda mais do que antes!"
sussurro ao vento
que prossegue surdo
a fecundar as flores...
do meu jardim
onde outrora só brotavam
folhas mortas e pedras
eternamente mudas.
CLITÓRIS TANTRA
Ela:
Rosa nos lábios
Negra entre as pernas
Invadida pela rigidez
do meu amor
Escancarada ela...
Nas paredes de algodão
listrado que
nos cercam ecoa
O mantra vaginal:
Hummmm...hummm...ai....
REQUIÉM
a Avelino, Yara e Maria Ezequiel
Daria meio mundo, se em mãos o
tivesse apenas para lembrar o que me disseste em
teu leito de morte àquela tarde
chuvosa da infância mas o mundo é meu campo
de visão é o que ocupa meu
olhar e não há como
dividí-lo ou compartilhá-lo contigo
nesta noite igualmente úmida enquanto cruzo meu corredor
senhor de meus fantasmas e em mim a luz é
soberana
tuas últimas horas foram dolorosas ou de paz
tremendamente única?.............
Logo saberei, mas não temo
a luz é soberana e me guiarei por
ela até
tocar-te em sonho
ou além .
SOB EFEITO DE MACONHA 02/08/00
A graciosidade da criação que pretensamente
poderia chamar de EU - invade essa tarde -
fim de todas as tardes e de nenhuma noite
sentado na poltrona do tempo - frase inútil -
nuvens cruzam o céu como aves migratórias
como que obrigado movo também _EU.
Mais tarde irei nos ver - do outro ambos somos
o espelho olha nos teus próprios olhos ao olhar
os meus...a alma minha nos teus óculos
não me iludo, tudo que fiz por mim mesmo desde então
foi te esperar.
IMAGENS
Me lembro de uma tarde chuvosa
De um sábado já tão distante
música
Copos de vinho
Nós dois
Declarações dissimuladas nos
Nossos olhos de amor
O incenso queimava
E em suas cinzas o
Perfume doce da flor
Aparentemente a vida
Continuou apesar
de nosso esforço por contê-la
Constatação:
a vida passa mesmo
Passa pelos dedos
Envelhece corpo e alma
Deixando objetos, amores
lembranças e cheiros
Que em outro dia nos serão
tão nostálgicos.
SEM TÍTULO
Como sempre. Tudo continua como sempre.
Salta pela janela caro ego e ganha
o Mahhat tattva em suburbanas ruas da mente
nas cidades
- concreto e aço e asfalto e abertas
fossas - atrás dos meus
olhos castanhos.
Encontrada a afeição pura
suguei seu seio, e ao
sugar seu seio puro veneno é sorvido.
Eu Chorava
ás vezes oU ás vezes sorria
ao eNgasgar-me
com seus cabelos negros e dIzer
tantas paLavras
santas e carIciosas de amor
que suficaNdo foram
ao beijar os Grandes lábios
úmidos e mUdos da
minha Afeição
TAIJASÃNI
Por não mais sabermos o
que dizer
ferimos nossos corações com palavras
duras...
Como sempre.
Como hoje.
Penso ser eu o único morto
da cidade a analisar o aspecto sombrio do não-ser
Sete Lagoas - então viúva minha -
velha Gibeom sitiada,
daquelas noites de vento parado
exalando silenciosa saudade em seu
velar,
sol e lua detidos
entre siderúrgicas nuvens.
.....................................................................................
Numa esquina
morta entre a rua Platina e a
linha férrea, àquela época
uma já desativada
ferrugem
graciosa
ela lambia
ajoelhada
as feridas da minha alma
agora nua, á espera do depois.
Assim me defrontei com a mais paradoxal
verdade,
O TEMPO,
a única coisa capaz de curar
toda e qualquer dessas feridas
e ao mesmo tempo salgar
impiedoso cada uma
delas...
tudo enquanto age como um bálsamo das minhas mágoas.
SEM TÍTULO
Me mande uma carta de amor
Cheia de mentiras
De amor
Bem intencionadas ou não
Por embriaguês
Desvêlo
Ou compaixão
Diga que me amas mesmo que mintas
Que na verdade amor por mim não sintas
Me dê essa certeza de alguma coisa
Uma qualquer coisa inexistente
Minha e tua
Amanhã me questiona se eu teria sido feliz
Em ser só teu só teu só
Teu ser só teu e nada mais
Que isso.
IMPRESSÕES TARDIAS
Eu que sempre julguei
não ter sentido a vida sem amor
na minha própria não o tinha até então...
amor ainda que hoje distância,
amor embora desengano e sendo
o aor filosófico, teórico apenas
belo só é enquanto mentira.
Na busca ao mesmo a liberdade máxima:
SER INFELIZ POR VONTADE PRÓPRIA.
SONETO
Antes fosse apenas ti
Minha cara solidão
Mas talvez seja a razão
Essa dor maior que sinto
.
O dilema de saber
Não ser esse o seu lugar
E saber não ter também
Outro lugar para onde ir
.
Ter em cada novo amor
Algo de último e primeiro
Negar do mesmo a existência
.
Mas ser dele prisioneiro
E ao final ter só a lambrança
Do que então podia ter sido.
SEM TÍTULO
Sigo caminhando rumo a um horizonte
Que não se afasta nem tampouco se aproxima...
Mas meu mundo é vasto
Mesmo sem cruzar os quatro cantos
Inertes do poente.
IMITAÇÃO DE VINÍCIUS
Passa lento o dia
Enquanto preenches com angústia
Os espaços vagos do meu tédio
( ... )Até o anoitecer procuro rimas
Que me tirem dessas reticências
Nas quais me puseste
Só então saio a tua procura
Nos cantos escuros das esquinas
Nos Pontos de lotação
E sigo as trilhas pelas quais
Talvez tenhas passado e nelas
Esquecido vossos passos
2:30 da madrugada, rua Equador...
Me desencanto...penso em ti por
Pura falta do que pensar.
TARDIA
Foi então que percebi
Ser solidão o
Meu
Instante no que
Chamas de tua vida.
CONVERSA COM PAULO LEÃO
Portas?
Qual delas
Importa?
Há de se abrir as portas para importar
Exportação emocional?
_______________ .
Não faço mais rimas para mulheres
Agora meus poemas são mais sérios.
Edifício Maletta 09/06/01
DUAS HORAS ANTES DELA PARTIR
Deserto de concreto pontilhado de melancólicas lâmpadas
Fluorescentes, incandescentes e neons, postes e marquises
Diante minha janela - reminiscências daquelas noites de
Solitários apartamentos empilhados em prédios cravados em
Bairros classe-média, centrais ou periféricos de
Onde me era permitida uma vista parcial e incompleta de algo
Que supostamente seria um belo horizonte
Imaginando o quanto custaria e o quanto demoraria para me ser servida
A felicidade: pelas metades me seria servida
Nos parcos intervalos de uma tristeza
FELICIDADE A LA CARTE; eu queimaria meus dedos, lábios e língua
Com ela ainda quente e lamberia o prato sujo em que ela me seria
Traga - marmitex de lixo ou porcelana sanitária?
O quão caro me sairia tão porco almaço, servido na imunda
Pensão da possibilidade?
Vê?
Sem você tudo era tão mais difícil
Te espero desde já
Volta o quanto antes
E afasta de mim esse algo sombrio
Que por vezes insiste em me manter cativo.
12/10/01
SONHO
Sonhei que morria
Só, mas eu estaria
Belo àquela manhã
Além de todo sofrimento
E como todo devoto do incognoscível
Feliz dos pigmentos de tão indistinto quadro
Te amo EU, já que ninguém te dizes!

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